"A marca principal deixada por essa atividade foi nos reconhecer no homem ridículo e receber a oportunidade de realizar as mesmas experiências dele, porém sem aquele forte sentimento de angústia que ele sentia..."]
Seguem dois textos incríveis de nossos alunos, sobre o ciclo onde discutimos "O Sonho de Um Homem Ridículo" de Dostoievski.
Qual o mérito em ser bom sem conhecer as vantagens do mal?
[por NICOLLE PELICER CASTRO NEVES, aluna do LabHum graduação]
O LabHum me permitiu uma nova perspectiva sobre a análise da leitura de clássicos, foi realizado algo com mais foco nos sentimentos, o que possibilitou uma percepção ainda mais profunda, sem a necessidade de se atentar a perguntas de vestibulares ou análise de palavras, foi uma viagem para dentro de nós mesmos.
A escolha do texto não poderia ter sido melhor, visto o contexto da sociedade moderna em que vivemos, um conto tão antigo mas que dialoga de problemas tão atuais e nos mostra que devemos reencontrar a nossa menininha vestida em trapos e gritando desesperada por atenção, a menininha, que como o homem ridículo, expulsamos a muito tempo atrás mas que é um alento saber que ela ainda existe.
A experiência da leitura foi um verdadeiro misto de sentimentos, de início, senti o desespero do homem ridículo em não se mostrar ridículo e não se permitir sentir. Em um segundo momento, quando ele viaja para o novo mundo, tão semelhante fisicamente ao nosso, contudo, com uma forma de viver tão diferente, senti algo bom, como se aquela fosse realmente uma sociedade melhor.
Em uma releitura, pude observar que não eram melhores, apenas não conheciam o mal, e qual o mérito em ser bom sem conhecer as vantagens do mal? Sendo assim, eles escolheram se corromper e deixaram claro que foi escolha deles, algo que em uma primeira leitura me deixou com um sentimento de angústia e desespero, mas o conto nos mostra que da mesma forma que eles escolheram o mal, em algum momento eles podem escolher o bem e agora com o livre arbítrio e nos deixa com um sentimento de esperança em relação a nossa própria sociedade, conhecemos o Bem e o Mal, cabe a nós decidir qual queremos seguir e assim fazer pegar a velha máxima citada no conto: Amai uns aos outros.
A marca principal deixada por essa atividade foi nos reconhecer no homem ridículo e receber a oportunidade de realizar as mesmas experiências dele, porém sem aquele forte sentimento de angústia que ele sentia e assim vemos que podemos sim sentir, mesmo quando os sentimentos não são tão agradáveis quanto queríamos.
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A necessidade do reencantamento do mundo
[por RODRIGO PEREIRA BARBOSA, aluno do LabHum graduação]
"O Sonho de Um Homem Ridículo" de Dostoievski e as discussões propiciadas por ele me trouxeram muitas reflexões acerca das questões que tocam a essência humana, as quais estão mencionadas abaixo.
O contato com essa obra me fez pensar bastante que utilizando somente a razão não conseguimos ter uma boa percepção das coisas que estão acontecendo ao nosso redor, haja vista que muitas delas estão interligadas aos sentimentos ou com as experiências vivenciadas com outras pessoas, ou seja, é necessário darmos notoriedade para a realidade que estamos inseridos e não somente procurarmos a reposta em nós mesmos. Assim, ela estimulou em mim a importância de estar aberto para a ouvir as outras pessoas e procurar entendê-las nas suas particularidades.
Além disso, outra coisa despertada em mim é a pertinência de ser conhecer como pessoa, como cidadão. Levando isso em consideração, é preciso deixar claro quais são os meus valores e que nenhuma pessoa possui a verdade absoluta em seu ser, ou ainda, em sua cognição, independente do lugar social que ocupe, pois há várias maneiras de se obter conhecimento e, além do mais, há diversas formas de conhecimento, e nenhuma pessoa é detentora de todas elas. Dessa forma, fica evidente que sempre devemos estar abertos para aprendermos com outras pessoas.
Ademais, refleti bastante sobre a questão de que nenhuma pessoa é boa ou mal por natureza, isso está diretamente relacionada com os valores morais e éticos que a pessoa foi desenvolvendo ao longo da sua formação como cidadão, uma vez que somos seres sociais em formação, e, dessa forma, sempre há possibilidade de ser melhor ou pior como pessoa. Em suma, ser bom ou mal, é o fruto da construção subjetiva de cada de indivíduo, e aquele que tiver os seus valores morais e éticos bem determinados, provavelmente, não será corrompido.
Assim, a leitura do conto "O Sonho de Um Homem Ridículo" aguçou em mim a necessidade do reencantamento do mundo com a intenção de melhor entendê-lo e de melhorá-lo. Esse reencantamento passa, principalmente, pela ressignificação das relações humanas presentes na sociedade, nas quais o ter é mais valorizado do que o ser. Partindo disso, vislumbro que é possível envolver mais sentimentos e emoções nas relações sociais. Outrossim, pensando que futuramente serei um profissional de saúde, é de grande notabilidade valorizar o outro, ficar aberto as demandas que possam vir do paciente, e não ficar apenas pensando que sou o detentor de todo o conhecimento, simplesmente, porque me formei em medicina. Com isso, reencantar o mundo pode ser entendido como uma maneira de olhar o paciente nas suas particularidades e ao mesmo tempo holisticamente, buscando entender várias questões que podem estar envolvidas no processo saúde-doença (religião, etnia, gênero etc.), e não apenas ministrar um medicamento e achar que é o suficiente. Dessa forma, é necessário acolher, deixar o paciente falar, pois a esculta é uma parte importante do atendimento médico e demonstra um pouco da sua preocupação com outro.
Em resumo, o contato com essa obra e com o curso me fizeram acreditar, ainda mais, que posso ser uma pessoa melhor e que é possível melhorar o mundo a partir do reencantamento baseado na humanização.