Projeto FotoCulturaParaTodos

05 IMG 0080Este projeto é desenvolvido desde 2014 e desde 2018 é um projeto de extensão da UNIFESP. A ideia é simples, acreditamos que a fotografia, mais que arte ou técnica, é um estilo de vida, capaz de iluminar e alegrar nosso cotidiano, mostrar a beleza do mundo, permitir extravasar sentimentos, virar profissão, ou apenas ser algo legal no dia a dia. Neste projeto damos aulas de fotografia para crianças e jovens que se tratam de câncer no GRAACC. Esse é um trabalho voluntário, com o único objetivo de melhorar a vida deles um pouquinho. Assim esperamos que a fotografia seja capaz de se tornar parte do dia a dia deles, seja como simples hobby, ou até mesmo como profissão. As aulas são sob medida, individuais ou em pequenos grupos, e o conteúdo depende da demanda de cada aluno, podendo ser uma aula única ou durar meses. Se for preciso doamos uma câmera para o aluno e buscaremos resolver cada dificuldade que aparecer, com a ajuda dos amigos. Precisaremos de ajuda, claro, fale com a gente!
Dúvidas e contato: bittar@unifesp.br
Aulas no GRAACC (dentro do hospital do GRAACC, apenas para pacientes)
Terças de manhã 10h-12h
Quintas de manhã 10h-12h
Nesse caso a inscrição é diretamente com os professores.
Nossa página no Facebook: https://www.facebook.com/fotoculturaparatodos?fref=ts
Coordenação do projeto: Yuri Bittar
Diretor do Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde (CeHFi-UNIFESP): Prof. Dr. Dante Marcello Claramonte Gallian

Revelando a luz da fotografia: ensinando fotografia para jovens e crianças em tratamento oncológico

Revealing the light of photography: teaching photography to young people and children undergoing cancer treatment

Yuri Bittar; Cassia Y. Assano
FEVEREIRO DE 2020

Resumo

Este artigo é, sobretudo, um relato de experiência. Objetivamos apresentar o projeto de extensão intitulado Fotografia e Cultura para Todos, atividade que leva aulas de fotografia gratuitas e livres para jovens em tratamento oncológico, idosos, jovens carentes e estudantes, apresentado os objetivos do projeto, como este foi construído e buscando mostrar como tem sido, na prática, realizar estas aulas. Queremos ainda mostrar o retrato, ou seja, os resultados que observamos, de forma empírica, como o desenvolvimento do olhar, da amizade e a inclusão.

Palavras-chave: fotografia, humanização, arte

Abstract

This article is, above all, an experience report. We aim to present the extension project entitled Photography and Culture for All, an activity that takes free photography classes for young people undergoing cancer treatment, the elderly, needy young people and students, presenting the project's objectives, how it was built and seeking to show how it has been, in practice, taking these classes. We also want to show the portrait, that is, the results that we observe, in an empirical way, such as the development of the look, the friendship and the inclusion.

Keywords: photography, humanization, art

Introdução

A ideia é simples, acreditamos que a fotografia, mais que arte ou técnica, é um estilo de vida, capaz de iluminar e alegrar nosso cotidiano, mostrar a beleza do mundo, permitir extravasar sentimentos, virar profissão, ou apenas ser algo legal no dia a dia. Neste projeto damos aulas de fotografia para crianças e jovens em tratamento oncológico, no GRAACC, e também para idosos e jovens carentes em outros ambientes. As aulas, especialmente no hospital, são sob medida, ou seja, individuais ou em pequenos grupos, e o conteúdo depende da demanda de cada aluno, podendo ser uma aula única ou durar meses. Quando possível doamos câmeras para os estudantes, sempre dependendo de doações. Todo o trabalho é realizado por voluntários, funcionários da Unifesp, alunos, e fotógrafos não ligados a esta universidade.

Sabemos que existe um sério problema de desumanização no estilo de vida atual, e para um jovem em tratamento de uma grave doença isso é mais intenso, parece haver um “afastamento radical da realidade da vida, na medida em que esta deixa de ser efetivamente uma realidade dada para passar a ser uma realidade a ser realizada” (GALLIAN, PONDÉ, RUIZ, 2012, p. 6) e entre as diversas possibilidades de buscar a humanização, ou seja, de aproximar o ser humano de sua realidade, estão as humanidades, como propostas por Gallian.

Esperamos assim que a luz da fotografia, entendida como uma das humanidades, e de outras expressões artísticas e culturais, possa iluminar a vida de algumas pessoas que podem precisar, e por luz nos referimos a abrir os olhos para a criatividade e tonar-se mais capaz de se apropriar da própria vida, tendo mais uma forma de linguagem a sua mão. Entendemos que, de posse de mais uma forma de linguagem e representação, as pessoas potencialmente se tornam mais capazes de representar e simbolizar sua visão da realidade e de si mesmo.

O relato que trazemos é empírico, ou seja, resultado das observações em campo.

História

Este projeto tem se desenvolvido desde 2014 e continua no presente, a partir da vontade de levar a fotografia, como prática e experiência, para jovens carentes. A oportunidade surgiu através do Hospital do GRAACC, instituição ligada á Universidade de São Paulo – Unifesp, que trata de crianças e jovens em tratamento oncológico, na cidade de são Paulo. Ali nos instalamos como uma oficina, inicialmente uma vez por semana. Com o passar do tempo, outros voluntários se juntaram ao projeto e passamos a atuar por mais dias na semana. O projeto cresceu e surgiram outras áreas de atuação, como aulas para idosos na Universidade Aberta á Terceira Idade – UATI-Unifesp, e aulas para os jovens fora do ambiente hospitalar.

Em 2018 a atividade foi credenciada como um projeto de extensão da UNIFESP, através do Centro de História e Filosofia das Ciências da Saúde – CeHFi, centro vinculado à Escola Paulista de Medicina da Unifesp. A partir deste momento o projeto passou a prever a atuação em outras áreas da cultura e arte, como literatura e meditação, e também abriu as atividades para alunos de graduação da própria Unifesp.

Experiências

A experiência, e o que aprendemos através dela, são o que nos permite apropriar-nos de nossas próprias vidas (BONDÍA , 2002). Esse é um dos principais objetivos do projeto, criar um momento de experiência através da arte.

No caso dos jovens pacientes do GRAACC percebemos que esse momento de pausa na rotina, como o tratamento e a escola, lhes permite uma grande experiência. Muitos são os relatos deles, ou dos pais, acerca de quanto eles apreciam as aulas, e como elas ampliaram sua criatividade.

Sabemos que a fotografia é uma busca por congelar momentos em meio a um caos de infinitas possibilidades (SONTAG, 1981), e nesse sentido a fotografar cria uma realidade de certa forma muito mais real do que o objeto que a originou, pois este, como a vida, está sempre mudando, fugindo, esvaindo, mas a fotografia nos oferece uma realidade escolhida, selecionada, uma supra-realidade, que permite prestarmos atenção a aspectos até então ignorados. Os sentimentos despertados pela imagem, também muito reais, podem mudar nossa própria forma de ver o objeto que, lá atrás, foi fotografado.

“A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar...” (BONDÍA , 2002.p.19).

Seguem abaixo algumas imagens que mostram um pouco do que acontece na prática:

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Foto 01: Jovem em busca do melhor ângulo: sempre mostramos como e pode buscar um ângulo diferente, experimentando possibilidades (Foto: Yuri Bittar, 2017).

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Foto 02: Aluna e instrutora: percebemos que o simples “estar do lado” já é muito poderoso (Foto: Yuri Bittar, 2015).

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Foto 03: Duas crianças descobrindo a imagem: juntos os alunos também mostram um ao outro as novas possibilidades, e se divertem (Foto: Yuri Bittar, 2016).

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Foto 04: Idoso na aula prática: para os mais velhos ter acesso ao fazer da fotografia os trás para dentro da sociedade (Foto: Yuri Bittar, 2017).

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Foto 05: Jovem aluno durante a prática: poder segurar e usar uma câmera profissional é uma grande surpresa para eles, que não achavam que isso seria acessível um dia (Foto: Yuri Bittar, 2015).

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Foto 06: Aluna durante a prática: introduzir a arte no cotidiano “ilumina” a vida (Foto: Yuri Bittar, 2016).

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Foto 07: Instrutora e aluno: muitos alunos precisam de um apoio físico para segurar a câmera, mas se sentem especiais por terem essa ajuda (Foto: Yuri Bittar, 2016)

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Foto 08: Jovem aluna durante a prática: acesso ao mundo “profissional”, à amizade, a um contato positivo, são extremamente impactantes para adolescentes (Foto: Yuri Bittar, 2015).

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Foto 09: Aluno editando vídeo: mostrar, mesmo de forma simples, como se faz um vídeo ou uma animação, faz realmente os olhos das crianças brilharem (Foto: Yuri Bittar, 2017).

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Foto 10: Pequenas mãos e uma grande câmera: “posso mesmo segurar essa máquina?” é o tipo de pergunta que ouvimos muito e nos emociona (Foto: Yuri Bittar, 2019).

Retrato

Faremos agora algumas observações empíricas, baseada no que experimentamos realizando a prática.

O que este projeto revelou até agora, o retrato que podemos vislumbrar, é que a arte, em especial a fotografia, tem um amplo potencial transformador na vida das pessoas para quem levamos estas aulas.

Descobrimos, com o tempo e a prática, que eles não apenas aprendem uma linguagem eficiente para sua comunicação - a fotografia - que pode até mesmo vir a ser profissão, mas que também tem nessa atividade um momento de descanso, de pausa na rotina estressante. Para os jovens percebemos ainda que eles se sentem extremamente valorizados pelo projeto, por pessoas adultas e “legais” dedicarem seu tempo para fotografar com eles, e ensinar algo que é uma prática para o futuro, ou seja, tratando-os sem considerar a possibilidade de não haver futuro, esquecendo a doença e se voltando para o olhar, para a criação, e nossas falas e ensinamentos repercutem neles de forma marcante, os pais nos relatam sobre como eles repetem frases e conceitos trazidos por nós, para outras pessoas. Para os jovens, percebemos ainda que o momento das aulas constitui um período onde a subjetividade deles é valorizada. Este é um objetivo e um cuidado que sempre temos em mente no projeto: que nos dediquemos a permitir que eles expressem sua interioridade, que sempre os tratemos não como doentes, mas que possamos sonhar com eles sobre um futuro, sobre novas possibilidades, sobre outros olhares a respeito da realidade. Notamos que essa experiência conjunta repercute nos nossos alunos de forma marcante. Tal fato é corroborado pelos relatos dos pais que acentuam como o conteúdo das aulas passa a ser repetido pelos pacientes para outras pessoas.

No caso dos idosos destacamos ainda uma importância enorme em relação à inclusão digital, uma vez que nessa faixa etária este é um grande desafio. Observamos em todos os casos que um fator de grande importância e muito valorizado pelos participantes é a amizade que se desenvolve, entre eles e com os instrutores.

Acreditamos que este projeto tenha forte impacto social, desempenhando parte do papel essencial da universidade em relação à comunidade. Em muitos momento vimos nos olhos dos alunos uma luz, um brilho, de quem subitamente está abrindo a visão para novos mundos, novas possibilidades.

Por fim, para nós voluntários, a sensação de fazer parte do projeto é quase indescritível, tamanha é sua amplitude. Na superfície sabemos, e temos esse retorno dos alunos, que nosso trabalho permite um momento mais leve no meio da pesada rotina do hospital e dos procedimentos médicos necessários, assim como as dificuldades de ser idoso. No entanto, pelos relatos colhidos, temos conhecimento de que pode ser ainda mais impactante. Tanto na vida prática (como quando a fotografia se torna profissão) como na emocional, na possibilidade de ampliar a convivência e o olhar para a imensidão que existe nas nossas vidas. É justo dizer que estamos certos de que o impacto emocional é uma feliz via de mão dupla entre alunos e voluntários.

Referências:

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. In: Revista Brasileira de Educação Jan/Fev/Mar/Abr 2002 Nº 19. P. 20-28. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf Acessado em 16/04/2014

GALLIAN, Dante Marcello Claramonte, PONDÉ, Luiz Felipe e RUIZ, Rafael. Humanização, humanismos e humanidades: problematizando conceitos e práticas no contexto da saúde no Brasil. Rev. Int. Hum. Med., v.1, n.1, p.5-15, 2012.

SONTAG, Susan. O Mundo-imagem. in Ensaios sobre a fotografia, tradução de Joaquim Paiva. Editora Arbor, Rio de Janeiro, 1981.

 

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