História de convivência sobre a leitura do Apanhador No Campo de Centeio
São Paulo
2015
Reler O Apanhador No Campo de Centeio (pois já o tinha lido na época da escola) me levou à adolescência, ainda mais em um momento em que tudo parece me puxar de volta aos 16 anos. Eu li o livro dessa vez, com os pensamentos desses mesmos anos.
Sempre tive uma forte identificação com o personagem principal, um pouco na forma de perceber que o mundo está todo errado, um pouco no jeito impulsivo de agir. E me era muito óbvio de que o livro fosse apenas sobre isso. Sobre nós, trangressores, que pensamos que não há um lugar nosso no mundo.
Desconcertante foi ver que há tantas formas de ler esse livro e tantas outras identificações. Ter que reler os capítulos a cada semana para a próxima discussão me fazia ter vários olhos para Holden Caufield. Eu me apropriava de cada experiência e cada perspectiva e devorava os capítulos seguintes me atentando a novos detalhes e à novos significados.
O que persistia, porém, era essa minha inquietação. Sobre o que tanto Holden buscava, o que poderia ser tão importante a ele, que percebi que poderia ser tão importante a todos que se confrontam com esse livro. Que nos incomoda, que não queremos nem saber que existe. Preferimos continuar com nossa vidas, apenas seguindo.
Ao longo da história há fortemente a busca pelo interlocutor ideal. Aquele que realmente se importa, que possa sanar a inquietação. Olhar nos olhos de alguém e dizer: “Você não sente que tem algo de errado com o mundo lá fora?” e ouvir como resposta aquele sim, que te fará ter uma conexão para sempre com aquela pessoa.
É muito simples deduzir que Holden busca o humano. Mas experimente se debruçar na pergunta “o que é esse humano?”. Eu me repetia essa pergunta assim como o livro repetia a pergunta de para onde vão os patos quando o lago congela no inverno. E então eu percebi que o meu humano era aqueles patos, aproximados por uma grande metáfora. Para onde vai o que nos é mais instrínseco? Não pode se deixar congelar, tem que ir para algum lugar!
Durante as histórias de leitura, pude ver que a humanidade é esse olhar para o outro. Foi o que me fez absorver experiências que não eram minhas, mas tornaram-se minhas. Pessoas tão diferentes, de idades e lugares tão diferentes que ficaram tocadas da mesma forma com a delicadeza dos poemas da luva do Allie.
Não quero me estender nesse relato, pois sei que Holden Caufield assim não o faria. Algo que devemos levar dele é entender que as maiores ações e descrições permanecem em nossas mentes. O maior trunfo do Apanhador é perceber que o que se passa no livro (que dura apenas três dias em ação), tem muito mais a ver com o que se passa na cabeça do narrador e em nossas próprias.
Holden, o apanhador. Que apanha o que tentamos esconder com palavras complicadas, ou com vários porres aos finais de semana. Sejamos todos, apanhadores.